SEXO NA PANDEMIA
Será que a restrição social e a incerteza sobre o futuro tem alguma relação sobre qualidade de vida das pessoas no tocante à função sexual? As pessoas têm mantido sua atividade nos mesmos níveis? Mulheres e homens são impactados da mesma forma no tocante à atividade sexual durante a pandemia? Acho que algumas dessas respostas podem ajudar a refletirmos sobre nossa qualidade de vida mental e física, em casa ou fora dela.
As restrições sociais generalizadas adotadas durante a pandemia de COVID-19 parecem ter interrompido significativamente as rotinas sexuais e a qualidade geral da vida sexual das pessoas. A ciência tem mostrado que, sob essas condições, as pessoas ficam mais ansiosas, zangadas, estressadas, agitadas, o que pode gerar sérios efeitos negativos sobre a saúde física. Associadas a esses sintomas, estudos têm mostrado que a inatividade sexual está significativamente relacionada ao câncer, a problemas na bexiga, a visão deficiente, a doenças cardiovasculares e seus fatores de risco, incluindo diabete, hipertensão e colesterol alto. Outras associações entre inatividade sexual e situações de forte stress: perda auditiva e demência para homens, problemas nas articulações, ossos ou nas costas, problemas gastrointestinais e doenças gengivais em mulheres. Na totalidade, esses resultados indicam que a atividade sexual pode ser uma atividade importante para manter a saúde física e emocional bem-estar.
Diante de todo esse quadro de doenças, o melhor é parar de ler este artigo e procurar seu parceiro, mas calma aí. Ainda tenho muito mais a dizer, caro leitor.
Na Inglaterra, por exemplo, parece que os homens mais jovens estão se beneficiando sexualmente durante esse período. Naquele país, houve uma prevalência particularmente mais alta de sexo para homens mais jovens, com alguma relação familiar fixa, empregados, com alta renda familiar, com consumo maior de álcool e em isolamento social por maior tempo. Opa! Lá as atividades mais frequentes são regadas a vários pints de cerveja, por exemplo. Se você ficou curioso, o estudo mostrou que, durante a pandemia, os ingleses têm realizado alguma atividade sexual, em média, 1,75 vezes por semana (homens 3,23 e mulheres 0,88 vezes).
Outro dado curioso sobre a atividade sexual durante a pandemia é que, entre os judeus ortodoxos de Israel, as mulheres estão sendo aconselhadas a não se banharem no Mikvah. E o que é isso? Bem, o sistema de “Pureza da Família” judaica ortodoxa, envolve a imersão das mulheres em uma piscina ritual, a Mikvah, sete dias após o final da menstruação. Até o ritual de imersão, o casal não pode se tocar. Assim, durante o período de pandemia e de lockdown em Israel, ir para o Mikvah pode ser impraticável ou mesmo aterrorizante para várias mulheres. Afinal, alguns banhos de Mikvah são áreas públicas com muito tráfego de pessoas. Este debate tem causado muita tensão dentro da comunidade ortodoxa judaica.
Na Turquia, país de maioria muçulmana, a frequência média de relações sexuais aumentou de 1,9 para 2,4 vezes por semana durante a pandemia em comparação com o primeiro semestre do ano passado. Especificamente entre mulheres, houve a diminuição do desejo de engravidar, do uso de contraceptivos, mas houve mais relatos de distúrbios menstruais que antes da pandemia. Para os cientistas, as razões que explicam os resultados estão atreladas à continuidade do espaço familiar, o que inclui tempo maior em casa.
Entre as italianas, na pandemia, foi observada uma forte diminuição na atividade sexual em mulheres em idade reprodutiva e que trabalhavam fora de casa. Entre as participantes do estudo, a frequência de, pelo menos, quatro relações sexuais por mês diminui 52,8%. Além disso, o estudo apontou um desejo menor por cuidados com o corpo durante esse período. Outro dado é que as mulheres com maior escolaridade apresentaram maior declínio em termos de atividade sexual e de qualidade de vida, o que pode ter relação com a maior propensão à leitura crítica de informações sobre a COVID-19.
Nos Estados Unidos, sentir mais desejo sexual, solidão e estresse tem induzido a mais adaptações sexuais para satisfazer necessidades psicológicas ou aliviar estados de humor negativos. Naquele país, as mudanças no comportamento sexual apontam para um aumento nas pesquisas sobre pornografia, vendas de brinquedos sexuais e postagens eróticas nas mídias sociais. Este padrão, consistente com a integração de internet e de plataformas digitais à vida sexual, sugere que, quando as oportunidades de busca por sexo são limitadas, as atividades on-line e “solo” podem ser usadas para preencher algumas ausências.
Independente do local, a maioria dos estudos aponta que os parceiros têm provavelmente sofrido com a associação entre maiores demandas profissionais, parentais e de cuidado com um número maior de estressores (por exemplo, reorganização de subsistemas familiares, renda reduzida). Essa associação tem impactado fortemente os sentimentos de discrepância de desejo sexual angustiante, diminuindo importantes gatilhos contextuais e emocionais para a experiência de excitação ou diminuição dos elementos lúdicos associados à satisfação sexual.
Os dados publicados têm apontado para mudanças (drásticas) na qualidade de vida sexual das pessoas, mas estas, não estão relacionadas a idade, a status socioeconômico ou ao gênero. Isso significa que algumas mudanças possam ser mais observadas em alguns grupos que em outros, mas não que seja capaz de estabelecer regras universais. Afinal, a sexualidade, como parte da subjetividade humana, não pode ser estabelecida a partir de regras rígidas ou medidas estatísticas. Há de se respeitar os contextos individuais, culturais, religiosos, étnicos etc.
Por fim, em detrimento da incorporação das novidades tecnológicas (sobretudo entre os americanos), as atividades sexuais em parceria têm demonstrado fortes correlações positivas com melhorias à saúde mental e à qualidade de vida das pessoas. Os estudos apontam que atividades como tentar novas posições, agir em fantasias, participar de BDSM, dar e receber massagens podem ter grande impacto na vida sexual das pessoas. Mas independente disso, a ciência, ou mesmo a sabedoria popular, em períodos de grande estresse ou não, vem encorajando novas atividades sexuais com um parceiro como uma estratégia útil e terapêutica de melhoria da vida.
Filosófica, ética, religiosa ou psicologicamente ainda há muito para se discutir sobre sexo, todavia, com toda essa pandemia, pode ser que nem eu e nem você estejamos aqui para todo esse embate, por isso…..